A serventia extrajudicial de Registro de Imóveis, em conjunto com outros órgãos públicos, torna-se deveras vital para o controle e manutenção da sustentabilidade ambiental do Brasil, eis que possui seguramente os dados necessários dos imóveis rurais e urbanos, tornando-se um verdadeiro fiscal da lei para fins de qualidade de vida da sociedade e das futuras gerações. O termo "sustentável" surgiu, primordialmente, na década de 1970, pela comunidade científica, para designar a possibilidade de o ecossistema não perder sua capacidade de absorver tensões ambientais sem mudar seu estado ecológico, denominada resiliência. Nos anos 1980, passou a qualificar o termo desenvolvimento. Na Carta Magna de 1988, em seu artigoo 170, inciso VI, verifica-se que a ordem econômica tem entre os seus princípios justamente a defesa do meio ambiente. Da mesma forma, o artigo 225 da CF assegura a todos o meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Desenvolvimento tornou-se de utilização corriqueira. Ele passou a ser debatido na ecologia e na economia. Trata-se de algo imperioso à macroeconomia, por reconhecer limites naturais à expansão econômica e romper com a lógica social do consumismo. Essa interação entre contrários (desenvolvimento e sustentabilidade) demanda a crítica ao próprio desenvolvimento.
Pode-se falar em sustentabilidade em sentido restrito ou ecológico e em sentido amplo. No primeiro caso, aponta para a proteção e manutenção, no longo prazo, de recursos por meio de planejamento, economia e obrigações de conduta e resultado, demandando a diminuição (quantitativa e qualitativa) da poluição. Já a sustentabilidade em sentido amplo se relaciona aos três pilares da sustentabilidade: ecológica; econômica; e social, tornando-a um conceito federador, que define condições e pressupostos jurídicos para a evolução sustentável. A sustentabilidade, enquanto princípio jurídico-constitucional fundamental, deve promover o equilíbrio entre uma série de fatores que tocam tanto o direito quanto a política, adentrando diversos aspectos do convívio em sociedade, inclusive naquilo que concerne à economia.
É, portanto, um princípio constitucional que determina, mediante eficácia direta e imediata, a responsabilidade estatal e social pela concretização do desenvolvimento material e imaterial inclusivo, durável, equânime, limpo, inovador, ético e eficiente, para assegurar o direito ao bem-estar. Já uma política sustentável deve inserir todos os seres vivos em um futuro comum, por isso, deve ser multidimensional, assim como é o bem-estar, devendo consolidar o cuidar ambiental, sem ofender o social, o econômico, o ético e o jurídico-político, já que todas essas dimensões compõem a sustentabilidade como princípio e valor.
A sustentabilidade se separa do desenvolvimento sustentável, em que pese o fato de serem constantemente utilizados como sinônimos. A noção de desenvolvimento sustentável relaciona desenvolvimento e sustentabilidade, de maneira que o aquele se baseia nesta.
O Supremo Tribunal Federal, na ADI 3540, Relator Min. Celso de Mello, já entendeu que o princípio do desenvolvimento sustentável tem caráter constitucional, encontrando legitimação em compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, permitindo o justo equilíbrio entre a economia e a ecologia. O desenvolvimento sustentável subordina-se, entretanto, ao conflito entre valores constitucionais relevantes. Trata-se de condição inafastável, que não esvazia seu conteúdo essencial. Dos mais relevantes direitos fundamentais constitucionais é a preservação do meio ambiente, a ser resguardado em prol da presente e das futuras gerações. O constituinte originário foi tão incisivo na proteção ao meio ambiente que uma das únicas exceções ao princípio da responsabilidade penal atingir apenas pessoas naturais, foi a de condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, em conformidade com o microssistema da lei 9.605/98. Não se pode olvidar que a administração pública em geral tem o dever de proteger o equilíbrio ambiental, sendo que a responsabilidade civil da administração pública por danos ao meio ambiente, decorrente de sua omissão no dever de fiscalização, é de caráter solidário, conquanto a execução seja subsidiária, conforme Súmula 652 do STJ. Destarte, o Superior Tribunal de Justiça entende que não existe direito adquirido para degradar ou poluir o meio ambiente, assim, proprietários de imóveis em áreas preservadas têm a obrigação de reparar o meio ambiente, mesmo quando não foram os agentes responsáveis pela degradação, sendo desnecessário asseverar culpa ou nexo causal como determinantes do dever de recuperar a área de preservação permanente. Em tal medida é que na proteção ao meio ambiente e respectivo desenvolvimento sustentável o texto constitucional assegura o uso da ação popular por qualquer cidadão, bem como o do inquérito civil público e da ação civil pública pelo Ministério Público Federal ou Estadual e outros colegitimados, visando ampliar seu espectro protetivo do respectivo direito difuso. A lei 10.650/03 dispõe sobre o acesso público aos dados e informações ambientais existentes nos órgãos e entidades integrantes do Sisnama, especialmente quanto à qualidade do meio ambiente, devendo permitir o acesso público aos documentos, expedientes e processos administrativos que tratem de matéria ambiental, defluindo a notável importância dos registros públicos. Ocorre que se evidencia a relevância, em tal temática, das serventias extrajudiciais de Registro de Imóveis, previstas no artigo 236 da Constituição Federal, lei 6.015/73 e lei 8.935/94, as quais asseguram efetivamente a proteção da legalidade e segurança jurídica ao meio ambiente equilibrado, efetivando os atos necessários para a salvaguarda legal dos atos registráveis e averbáveis na circunscrição dos imóveis. Os imóveis, segundo dicção dos artigos 79 a 81 do Código Civil, são o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente, além dos direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram, além do direito à sucessão aberta. Evidenciando a importância do controle sobre a floresta plantada, a Consolidação Normativa Notarial e Registral do Rio Grande do Sul prevê, em seu artigo 605, que 605 uma vez averbada a existência da floresta, será permitido o registro de compra e venda das árvores ou da respectiva madeira e de sua exploração, ou de outras formas específicas de alienação ou oneração desses bens, assim como dos direitos a eles relativos, independente do solo. A propriedade, sem dúvida ou entredúvida, é um direito constitucional previsto no artigo 5º, caput da Constituição Federal, além do Código Civil e de legislações correlatas, contudo, precisa ser utilizado de forma racional, proporcional e adequada, precipuamente respeitando a legislação ambiental. O meio ambiente, até mesmo por uma questão fática e jurídica, está correlacionado geralmente a um imóvel físico e legal, o qual estará registrado em dada circunscrição de registro de imóveis, se for particular, ou perante a Secretaria de Patrimônio da União - SPU, se for de tal ente federado. Deveras, o imóvel deve guardar estreita relação com o cumprimento da função social da propriedade, conforme a Constituição Federal e o próprio Código Civil, que diz em seu artigo 2.035, parágrafo único: "[...] nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos". Não se admite mais, como no Código de 1916, o uso patrimonialista, irracional e inadequado de propriedades imobiliárias urbanas ou rurais, dado que o real descumprimento da função social da propriedade poderá levar a graves sanções, tais como a majoração de impostos reais ou até mesmo a desapropriação para reforma agrária (área rural) ou urbana (Estatuto da Cidade). O Registrador de Imóveis, verdadeiro fiscal da lei quanto à seara imobiliária, deverá observar estritamente as normas constitucionais, legais e de consolidações normativas das Corregedorias dos Tribunais de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça, as quais buscam preservar o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável. Assim é que os empreendimentos imobiliários, loteamentos, incorporações, desapropriações, tombamentos, regularizações fundiárias urbanas, obras públicas e construções particulares, conquanto tenham um elevado filtro efetivado pelos órgãos fiscalizatórios ambientais e pelas municipalidades, também receberão análise rigorosa do titular do registro de imóveis, o qual também é por rigor um fiscal da ordem jurídica. Na lei 6.015/73, por exemplo, tem-se que as servidões ambientais serão averbadas perante o Registro de Imóveis (art. 167, inciso II, item 23), enquanto o contrato de pagamento por serviços ambientais, quando este estipular obrigações de natureza propter rem, será registrado (artigo 167, inciso I, item 45). Da mesma forma, quando há o registro de um loteamento pela lei 6.766/76, deve o Registro de Imóveis observar se tais lotes se encontra em faixas não edificáveis ao longo das águas correntes e dormentes, com obrigatoriedade de reserva de uma faixa não edificável para cada trecho de margem, indicada em diagnóstico socioambiental elaborado pelo Município. A observância da faixa de domínio também em rodovias (5 metros) e ferrovias (15 metros) é essencial para a efetividade do princípio da legalidade, bem como do equilíbrio do meio ambiente, além da segurança viária e ferroviária, além dos cidadãos que ali perpassam.
As desapropriações por utilidade pública (decreto-lei 3365/41) podem ter como objeto a proteção ambiental, assim como as unidades de conservação, tais como Parques Nacionais, Reservas Biológicas e reservas particulares do patrimônio natural, com registro ou averbação no respectivo Registro de Imóveis (lei 9.985/00). Veja-se que as desapropriações amigáveis e as sentenças que, em processo de desapropriação fixarem o valor da indenização, serão registradas perante o Registro de Imóveis, conforme artigo 167, inciso I do item 34, além da imissão provisória da posse, no item 36 do mesmo inciso.
No Incidente de Assunção de Competência - IAC 13, o Superior Tribunal de Justiça consagrou o direito à informação ambiental e a possibilidade no registro de imóveis acerca de tais informações, assumindo, o Registro de Imóveis, em conjunto com o Ministério Público, papel vital para a sustentabilidade. Entendeu o Superior Tribunal de Justiça que o regime registral brasileiro admite a averbação de informações facultativas sobre o imóvel, de interesse público, inclusive as ambientais, sendo que o Ministério Público pode requisitar diretamente ao registro de imóveis a averbação de informações alusivas a suas funções institucionais. A averbação de notícia ambiental, torna-se fulcral para que tenha efeito erga omnes e as propriedades imobiliárias efetivem sua correlação com o desenvolvimento sustentável, sendo que o artigo 246 da lei 6.015/73 possibilita que sejam averbadas outras ocorrências que alterem o registro ou repercutam nos direitos relativos ao imóvel. Aliás, há efetiva necessidade de averbar ou registrar atos ou negócios relativos a situações ambientais do imóvel rural ou urbano, especialmente para fins de proteção do terceiro de boa-fé, na forma do artigo 54 da lei 13.097/15, ganhando conotação no fólio real e produzindo efeito erga omnes. Por sua vez, a regularização fundiária urbana, conforme a lei 13.465/17, instituiu procedimentos importantíssimos para áreas consolidadas e que abranjam medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais destinadas à incorporação dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à titulação de seus ocupantes. Destarte, o projeto de regularização fundiária urbana - REURB conterá, dentre outros, estudo preliminar das desconformidades e da situação jurídica, urbanística e ambiental, proposta de soluções para questões ambientais, urbanísticas e de reassentamento dos ocupantes, quando for o caso e estudo técnico ambiental. Controlando efetivamente a legalidade dos atos e negócios jurídicos registráveis e averbáveis, a manutenção do controle rígido da lei e da aplicação de normas ambientais e da função social da propriedade, em conjunto precipuamente com o Ministério Público Federal ou Estadual, haverá um grande favorecimento do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Deflui-se, portanto, que a serventia extrajudicial de Registro de Imóveis, em conjunto com outros órgãos públicos, torna-se deveras vital para o controle e manutenção da sustentabilidade ambiental do Brasil, eis que possui seguramente os dados necessários dos imóveis rurais e urbanos, tornando-se um verdadeiro fiscal da lei para fins de qualidade de vida da sociedade e das futuras gerações. Robson Martins - Doutorando Direito UERJ. Mestre Direito UFRJ. Especialista em Direito Civil, Notarial e Registral. Professor universitário. Procurador da República. Promotor de Justiça PR 99/02. Técnico JFPR 93/99. Érika Silvana Saquetti Martins - Doutoranda Dto ITE. Mestre Dto. UNINTER. Mestranda Pol Públicas UFPR. Espec Dto e Proc Trabalho, Dto. Público e Notarial e Registral. Professora Pós Graduação latu sensu Direito Uninter. Advogada. Fonte: Migalhas | ||
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